Alcance (Reach), para 8 solistas e orquestra sinfónica
Encomenda: Jovem Orquestra Portuguesa / Associação OCP
Duração: ca. 20'
Data de composição: 2019
Dedicada a Carlos, Gustavo, Jacinto, Nuno e Vanessa, utentes da CERCIoeiras
Estreia Mundial: 26 Julho 2019 | Konzerthaus de Berlim | 20º Edição Festival Young Euro Classics
Estreia Nacional: 28 Julho 2019 | Grande Auditório do Centro Cultural de Belém
Prémios: Festival Young Euro Classic - Melhor Compositor Europeu 2019
Duração: ca. 20'
Data de composição: 2019
Dedicada a Carlos, Gustavo, Jacinto, Nuno e Vanessa, utentes da CERCIoeiras
Estreia Mundial: 26 Julho 2019 | Konzerthaus de Berlim | 20º Edição Festival Young Euro Classics
Estreia Nacional: 28 Julho 2019 | Grande Auditório do Centro Cultural de Belém
Prémios: Festival Young Euro Classic - Melhor Compositor Europeu 2019
Sobre "Alcance":
ALCANCE (em inglês Reach)
1. Acto ou efeito de alcançar.
2. Distância que se consegue atingir, que consegue ser vencida
3. Força (da capacidade, do talento, da vista, da escuta...)
Alcance, para 8 Solistas e orquestra sinfónica, resultou de uma encomenda da OCP/Jovem Orquestra Portuguesa e teve a sua estreia na Konzerthaus de Berlim, no âmbito do Festival Young Euro Classics, a 26 de Julho de 2019, sob a direcção de Pedro Carneiro. A estreia em Portugal, dois dias depois, teve lugar no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém.
O papel dos 8 solistas foi desempenhado pelo ensemble Notas de Contacto, composto por cinco utentes da CERCI Oeiras (instituição que trabalha com pessoas com incapacidade cognitiva), e três músicos profissionais que trabalham regularmente com a CERCI Oeiras no âmbito de um projecto comunitário desenvolvido pela OCP (Orquestra de Câmara Portuguesa).
A peça é dedicada aos 5 solistas da CERCI Oeiras: o Carlos, o Gustavo, o Jacinto, o Nuno e a Vanessa, e aos 3 professores que os acompanharam nesta aventura: Ana Maria Santos, Óscar Carmo e Rui Borges Maia.
Sobre o trabalho com o Ensemble Notas de Contacto
Enquanto compositor já tinha trabalhado com um ensemble de músicos com incapacidades cognitivas, mas apenas no contexto de pequenos arranjos da música tradicional portuguesa. Foi a primeira vez que o fiz no contexto de uma peça original para orquestra.
Quando se trabalha com população com incapacidade cognitiva, uma das primeiras aprendizagens é que cada pessoa tem seu próprio mundo único de talentos e dificuldades. Por exemplo, manter um pulso rítmico constante pode ser a tarefa mais fácil para alguns e o maior dos desafios para outros. É frequente as deficiências cognitivas serem acompanhadas de deficiências motoras (dificuldade de coordenação, por exemplo). Sabíamos que em palco alguns deles poderiam bloquear se se sentissem inseguros, outros poderiam empolgar-se com o entusiasmo e perder totalmente a concentração ou ainda começar a rir ou a falar durante a apresentação do concerto. Foi necessário conhecer muito bem cada um dos 5 solistas, não apenas em relação aos seus talentos e dificuldades, mas também em relação ao perfil pessoal e emocional. O meu trabalho com esses 5 solistas não teria sido possível sem o conhecimento e a experiência da Ana, do Óscar e do Rui.
Juntos fomos descobrindo de que formas é que os 5 solistas poderiam interagir com a orquestra, com o maestro e com a partitura da peça.
Como criar música inclusiva para cinco pessoas que não aprenderam a tocar nenhum dos instrumentos de música habitualmente presentes numa orquestra sinfónica? Este foi um dos grandes desafios desta encomenda.
Primeiro, foi necessário encontrar os instrumentos musicais adequados para cada um deles. Dedicámos algum tempo a procurar instrumentos que produzissem sons complexos e que prescindissem de uma técnica exigente. Ou seja, instrumentos que soem bem, mesmo que o artista tenha dificuldades em ser técnica ou ritmicamente preciso. Cada um dos 5 solistas foi experimentando vários instrumentos e descobrindo os seus favoritos.
O principal instrumento de Carlos é o Waterphone, Vanessa já tinha experimentado Cajón e Glockenspiel, Jacinto toca o Spring Drum (um tambor que produz sons como trovões) e Nuno toca o Wood Chimes. E todos ficámos surpreendidos ao descobrir que Gustavo é excepcionalmente virtuoso a produzir com a boca um efeito especial de wah-wah no vibrafone.
O outro grande desafio que nos foi colocado foi descobrir como é que cinco pessoas que não sabem ler música podem interagir de forma inclusiva com a partitura da peça, com orquestra e com o maestro.
Quando comecei a trabalhar com este grupo, pensei que a improvisação com gestos seria a solução mais natural para este desafio. Cheguei mesmo a escrever sobre isso nas notas de programa iniciais. Mas à medida que o trabalho foi avançando em colaboração com o Rui, a Ana e o Óscar, acabámos por privilegiar outras formas de interação muito interessantes e muito eficientes.
No primeiro andamento, de carácter mais abstrato, cada um dos solistas toca seu instrumento principal. Os momentos precisos em que eles têm que tocar são indicados por um ecrã que vai mostrando fotografias dos seus rostos, dos instrumentos que devem tocar, e ainda instruções sobre a técnica e dinâmica de cada gesto: tocar com arco ou com baquetas, tocar pianíssimo ou forte, etc...).
No segundo andamento, com texturas polirrítmicas, há uma pulsação constante, na qual três dos solistas são convidados a imitar gestos do Rui, Ana ou Óscar, num conjunto de sinos asiáticos adquiridos especificamente para esta secção da obra.
No terceiro andamento, uma longa melodia, os 5 solistas da CERCI tocam uma textura harmónica livre no vibrafone, com arco ou baquetas. Apesar da peça utilizar harmonias atonais bastante complexas, eles sabem que notas devem tocar porque as lâminas do vibrafone possuem adesivos com cores diferentes. As cores são novamente indicadas por um ecrã controlado em tempo real por um dos músicos profissionais.
No final da peça é pedido aos solistas que toquem ainda mais um instrumento acústico, uma caixa de música com manivela, assente sobre um tímpano de orquestra que amplifica o som frágil deste pequeníssimo instrumento. A “partitura” da caixa de música, um extenso rolo de papel perfurado, acaba por se extender aos músicos da orquestra e ao público que assiste ao concerto na plateia.
Alcance foi a peça eleita pelo júri do concurso anual do festival Young Euro Classic, granjeando ao autor o prémio de melhor Compositor Europeu na 20ª edição daquele que é considerado o mais importante festival de jovens orquestras à escala mundial.
O prémio mais gratificante foi assistir à comoção que se sentia, quer entre o público, quer entre os músicos da Jovem Orquestra Portuguesa, pelo facto da componente inclusiva da peça ter corrido tão bem. Os 5 solistas tocaram com um genuíno sentido de compromisso e responsabilidade, e também com surpreendente sensibilidade musical, como verdadeiros músicos profissionais.
João Godinho
imprensa
- Observador: Artigo sobre a atribuição do prémio Festival Young Euro Classic - Melhor Compositor Europeu 2019
- Observador: "Jovem Orquestra Portuguesa apresenta em Berlim concerto universal e inclusivo"
gravação
Konzerthaus de Berlim, 26 de Julho 2019
Intérpretes nesta gravação:
Jovem Orquestra Portuguesa, sob a direcção de Pedro Carneiro
Ensemble Notas de Contacto:
Carlos, Gustavo, Jacinto, Nuno e Vanessa, utentes da CERCIoeiras
Professores: Ana Maria Santos, Óscar Carmo, Rui Borges Maia
Intérpretes nesta gravação:
Jovem Orquestra Portuguesa, sob a direcção de Pedro Carneiro
Ensemble Notas de Contacto:
Carlos, Gustavo, Jacinto, Nuno e Vanessa, utentes da CERCIoeiras
Professores: Ana Maria Santos, Óscar Carmo, Rui Borges Maia